12 -DETETIVE PARTICULAR EM ROUBO DE CARGAS – ROTINA QUE NÃO IMAGINAMOS!
12 -DETETIVE PARTICULAR EM ROUBO DE CARGAS – ROTINA
QUE NÃO IMAGINAMOS!
Hoje ao colhermos os periódicos do dia, chama-nos a atenção para
a reportagem de capa do jornal Folha de São Paulo; a crescente onda de roubo de
cargas no Estado de SP; logo percebemos a utilidade de reportar um caso que
resolvemos nesta mesma época do ano, há um ano.
Observo que os nomes e Empresas foram trocados, pois em nossas
histórias, pretendemos tratar a maneira e os detalhes que nos levaram a solução
do caso.
Estávamos em junho de 2016, o inverno apenas começava na capital
paulista, fomos indicados por um diretor de uma grande rede de varejo, para que
atendêssemos um Empresário da capital federal que possuía empresa de
transportes, esta distribuía cargas com medicamentos a serem entregues em
hospitais e secretaria estadual da saúde, aqui em São Paulo.
Confesso que o contato e o início do processo de investigação
deram-se de forma pouco usual, mas vamos a ele.
Em um sábado fomos contatados por um amigo, que por vezes, como
diretor de uma grande empresa de varejo, utilizou-se dos nossos serviços,
informando que um amigo seu, era dono de uma transportadora e tivera um de seus
carros roubados, estava com um grande problema, e ele iria passar o nosso
contato para que nos procurasse logo nas primeiras horas de segunda feira.
Passaram-se cerca de 10 dias e em uma quarta-feira, estávamos no
escritório quando toca o telefone era um Sr chamado João, empresário
brasiliense, se apresenta e diz que e estava em São Paulo e pela indicação, já
estaria a caminho do escritório para expor seus problemas, e saber se
poderíamos auxilia-lo. Confesso que não gostamos de atender sem hora marcada,
pois sempre realizamos consultas e pesquisas que nos facilitam, tanto no trato,
quanto na resolução e planejamento do trabalho a ser realizado.
Em uma hora, já tocava o interfone e pedimos que o cliente
adentrasse ao escritório, era um senhor com seus 55 anos, grisalho e muito
abatido, carregava uma mochila com alguns pertences e documentos, após os
cumprimentos cordiais, pedimos que se sentasse e relatasse o problema que o
trazia a Baker Street:
- Meu nome e João Albuquerque, sou proprietário de algumas
transportadoras em Brasília, Rio de Janeiro e Barueri-SP; ganhamos uma
concorrência do governo Federal para a entrega de medicamentos especiais, são
medicamentos para tratamento de câncer, são medicamentos muito caros, e deveriam
ser entregues para a secretaria da saúde do estado e alguns hospitais, embora
possuíssem grande valor de compra e venda, nunca nos preocupamos com a sua
segurança, pois possuem uma finalidade muito especifica e são de difícil
comercialização. Fato, que a cerca de doze dias, um dos meus caminhões de
entrega destes medicamentos, no valor aproximado de 4 milhões de reais, foi
roubado na cidade Guarulhos, acabo de vir da delegacia especializada em roubo
de cargas, e após estes doze dias do ocorrido eles nada apuraram sobre o roubo,
esta e a segunda ocorrência de roubo da minha filial de Barueri, nos últimos 60
dias, se bem que na outra eram outras mercadorias com um valor muito menor.
- Quantos funcionários possui a sua empresa em Barueri? –
indaguei.
-Possuímos um gerente de operação e cerca de doze funcionários
registrados, entre administrativos, motoristas e ajudantes – esclareceu ele.
- O que exatamente espera de nós, perguntei
- Estou desesperado, preciso que realizem uma investigação e
descubram se há funcionários envolvidos, se possuímos alguma chance de
recuperar esta carga, esclareço que não tenho seguro do caminhão e nem da
carga, se bem que o caminhão nem me preocupa, me preocupa exatamente a carga de
medicamentos, pois ela não é segurada, pelo seu alto valor é o pior ainda,
mesmo pagando a carga, corro o risco de perder o contrato público, que hoje
mantem nossas operações, desejo ainda saber se vocês mantem contato ou podem
intervir nas investigações policiais deste roubo junto a delegacia
especializada – perguntou João.
- Quanto a delegacia especializada, sim conhecemos o delegado
titular da pasta, posso afirmar que trabalham de forma séria e que possuem todo
um trâmite processual com relação as ocorrências policiais e jamais admitiriam
nosso concurso na investigação, ainda mais nessa fase de início; quanto a
chance de recuperar o carro ou a carga, devo lembrar que já se passaram doze
dias do roubo, neste caso o tempo é nosso inimigo, agora podemos investigar
para saber se seus funcionários estão envolvidos, e de repente chegarmos aos
receptadores e até mesmo a valiosa carga. Refazendo o local, confrontando os
depoimentos e analisando os fatos e a participação de cada funcionário
envolvido.
Percebemos que nosso cliente, ficou meio que inconformado, com a
realidade que o fizemos compreender, contudo mesmo sem muito acreditar em nosso
trabalho, ele não tinha muitas opções e resolveu nos contratar.
Findo os tramites iniciais, ele no mesmo dia, retornou a
Brasília e dois dias depois marcamos com seu gerente de confiança que ele
enviara de Brasília, o Sr Damião, uma reunião na transportadora em Barueri-SP.
Confesso que quando realizamos estas investigações no interior
das empresas, temos de apresentar um personagem, não podemos nos apresentar
como detetives particulares, encarregados de investigar delitos, neste caso em
particular, me apresentei como um funcionário do consorcio particular que
monitorava a entrega e o sumiço dos remédios para justificar ao governo do
estado, recordo haver me vestido e inspirado no personagem do famoso detetive
“Columbo” (seriado televisivo dos anos 80); expliquei que me vesti de forma
relaxada, barba e cabelos desgrenhados e uma mochila velha com uma prancheta
para as anotações, claro que dentro da velha mala, possuíamos um gravador de
áudio e vídeo para comprovar as entrevistas e tablet para checar os locais e
suas respectivas distancias.
Quinta feira, eram 10 horas em ponto, estava na empresa
transportadora na cidade de Barueri, conheci o Sr Damião, que sabia ser o
funcionário de confiança do nosso cliente e o coloquei a par de que era
fundamental, que somente ele soubesse de nossa verdadeira condição, todos os
outros apenas saberiam o que combinamos de contar, inclusive o gerente
operacional Walter que nos acompanharia na reunião inicial.
Iniciada a reunião o Sr Walter, gerente operacional um rapaz de
24 anos moreno, bem vestido e muito falante, que providenciou cópia de todas as
fichas individuais dos funcionários, bem como cópia dos boletins de ocorrência
dos dois roubos sofridos, fazendo uma explanação detalhada do comportamento de
cada funcionário envolvido ou não no acontecimento e marcamos para que ele
chamasse os dois funcionários envolvidos neste último roubo, para que na quinta
- feira próxima, mesmo dia da semana e no mesmo horário do roubo, nos
encontrássemos com um caminhão
semelhante ao roubado, e refizéssemos todo o percurso com os detalhes do
roubo, assim saberíamos o que de fato ocorreu neste tão nefasto dia.
Aproveitamos os sete dias que possuíamos para investigar os
envolvidos no roubo, o gerente Walter, o motorista Gumercindo e o ajudante
Thiago; checamos seus antecedentes criminais que nada apontaram, obtivemos seus
números de celulares e também descobrimos que o Walter além do telefone corporativo
utilizava-se de uma linha pré-paga para conversas pessoais, checamos os
endereços residências de cada envolvido e mapeamos seus relacionamentos e bens,
até ai tudo compatível com os estilos de vida, nada que chamasse a atenção, a
não ser o Walter que ganhava 5 mil
mensais, esposa não trabalhava, tinham um filho pequeno de 2 anos e um
patrimônio de apartamento próprio, e veículos que somados ao imóvel,
ultrapassavam os 800 mil reais, poderiam ser herança ou bons negócios, mas já
era algo para se pensar; conseguimos ainda imagens de câmeras de segurança de
uma empresa, nos momentos que antecederam o roubo, que nos seriam de muita
importância posteriormente.
Na quinta feira marcada, pedi que o Walter e os dois
funcionários me apanhassem em frente a uma estação do metrô, aleguei estar sem
carro, e para minha surpresa apenas o Walter e o motorista Gumercindo
compareceram. Walter alegou que o ajudante Thiago havia bebido muito na véspera
e sua esposa havia ligado dizendo que ele não compareceria ao serviço por estar
embriagado, sua atitude, era rotineira, tanto que ele estaria pensando em
demiti-lo, assim que terminasse a apuração da ocorrência.
Fomos para um endereço onde minutos antes do roubo o caminhão
investigado, havia recebido o complemento das carga roubada, o relógio batia
com os horários marcados no boletim de ocorrência, ou seja as 10 horas em ponto
o caminhão roubado recebera o complemento da carga, o motorista Gumercindo
comunica a empresa de monitoramento e estabelece o contato, ciente de que o
próximo contato seria apenas em 50 minutos depois; alegou ainda que cerca de 5
minutos depois o caminhão e abordado pelos ladrões que rendem o motorista e o
ajudante e os levam para um outro local deserto, os prendem no baú do próprio
caminhão e subtraem a carga descarregando em outro veículo não identificado,
alguns dos ladrões saem com a carga e outros os mantem presos no baú até
solta-los cerca de 1 hora e quarenta minutos depois em uma rodovia próxima.
Dentro deste período, a companhia de monitoramento quando não
avisada, informou o desaparecimento do veículo, ao escritório em Barueri que
acionou o gerente Walter que disse ter ido ao médico e estar coincidentemente
na zona leste de São Paulo, o que o facilitou a encontrar os funcionários
libertos há apenas quarenta minutos na rodovia e depois leva-los ao distrito
policial e elaborar a ocorrência policial.
Em toda está reconstituição que foi fotografada, filmada e
analisada todos os trajetos são marcados com tempo e trânsito e coerência das
informações; o que nos deu alguns pontos importantes a serem esclarecidos:
Gumercindo nos disse que não utiliza celular pessoal, apenas o
celular que a empresa fornece, e este os ladrões roubaram, porem nos
levantamentos nós comprovamos que tinha sim um aparelho pessoal; e omitiu tal
informação tanto para nós como para a polícia ao fazer o boletim de ocorrência;
disse que ficou em cativeiro com o ajudante Thiago por uma hora e meia e neste
intervalo o caminhão não parou nenhuma vez, lembrando que ele foi solto a cerca
de 20 minutos de onde foi preso, seria impossível os ladrões ficarem rodando
por mais de uma hora e vinte minutos na mesma região que tomaram o caminhão de
roubo; disse ainda que o seu ajudante Thiago tinha um celular novinho que
utilizava pela primeira vez naquele dia, contudo ele levara só o aparelho, não
tinha chip, pois ainda iria comprar, declarou seu roubo para a polícia com a
intenção de acionar o seguro posteriormente; e assim também não tinha nenhum
número para fornecer.
O gerente Walter, tomou o partido do motorista e confirmou e
montou a história que ele nos contou, com certeza não levou o ajudante Thiago
com receio que ele não contasse com exatidão o plano elaborado.
De nossa parte, reunimos todas as informações e deixamos os
averiguados muito à vontade, fizemos algumas indagações e colhemos o material
que comprovaria a participação dos averiguados no referido roubo, contudo para
nós, mais importante que os ligar ao roubo, seria encontrar o receptador da
carga, carga esta, que mesmo substituída em termos financeiros, faria uma
enorme diferença para os doentes de câncer do sistema público de saúde que
teriam de aguardar por meses ainda a sua substituição.
Em posse deste material conclusivo, nos reunimos com o nosso
cliente em Brasília, e chegamos à conclusão de que não poderíamos esperar as
autoridades intima-los e os ligar ao roubo formalmente, pela quebra de sigilo
telefônico, que sabidamente, quando realizada, os ligaria de fato ao roubo e
aos receptadores. Teríamos uma única chance de pressioná-los informalmente e se
eles não voltassem atrás os denunciaríamos à polícia com as informações que já
possuíamos.
Precisaríamos marcar uma reunião teatral, onde os ameaçaríamos,
caso a carga não fosse devolvida os levaríamos a polícia, caso a carga aparecesse
esqueceríamos o ocorrido e assim fizemos.
Alugamos uma sala de reunião em um luxuoso prédio comercial na
avenida Nações Unidas, aqui em São Paulo, estávamos presentes com mais 3
agentes, o dono da transportadora, Damião o seu funcionário de confiança,
convidamos o Walter a trazer o motorista Gumercindo e o ajudante Thiago, com o
pretexto de faze-los resolver assuntos trabalhistas a um advogado, nos reunimos
as 10 horas de uma terça–feira.
Damião, juntamente com o Walter, Gumercindo e Thiago já nos
aguardavam quando nos quatro acompanhados do cliente João adentramos a sala,
todos de terno e gravata, ao me reconhecer Walter e Gumercindo empalideceram,
após as apresentações tomei a palavra e comecei por expor os fatos, abrimos uma
pasta cheia de folhas, algumas em branco e blefando disse a eles que possuíamos
suas contas telefônicas, mostrei os seus números pessoais, as incoerências dos
seus depoimentos, fotos das suas residências, e familiares disse que sabia que
não haviam vendido a carga, pois em seus extratos bancários não registravam
aportes financeiros e que agora seria a hora deles contarem toda a verdade, ou
devolverem a valiosa carga, que não haveria consequências e que daríamos 48
horas a eles, ou seja na sexta feira as 11 horas da manhã o Sr João estaria
conosco na delegacia especializada de roubo de carga e transmitiria aos
policiais tudo o que havíamos apurado; disse ainda que eles teriam duas opções
naquele instante, a primeira seria de contar toda a verdade e nós mesmos
iriamos atrás da carga a partir daquele momento, ou simplesmente poderiam abrir
a porta e sair e devolver a carga até as 10 horas de sexta-feira. Para a nossa
surpresa sem dizer uma palavra o Walter levantou-se chamou os outros dois e os
três se retiraram da sala, nem preciso dizer que não apareceram na sede da
empresa nem na quarta ou quinta feira.
Na sexta feira, fomos acionados logo nas primeiras horas da
manhã, com a informação que o caminhão roubado fora localizado intacto no
município de Guarulhos -SP, abandonado, e o mais incrível, com toda a carga de
medicamentos intacta, enviamos um agente juntamente com o Damião (que
representava a vítima) para o Distrito Policial que localizou e apreendeu o
veículo com a carga, para a sua liberação.
Haviam-se passado cerca de 42 dias, desde o seu roubo, os
meliantes haviam acomodado o carro e a carga de forma que não se deteriorasse,
durante todo este período. O agente policial que realizou o auto de entrega,
sem saber das nossas atividades, ainda brincou com o Sr Damião ao entregar o
carro com a carga:
- Sr. Damião, em mais de 20 anos como policial, eu nunca
presenciei nada parecido, o Sr. tem muita sorte, como se tivéssemos encontrado
uma “mosca branca de olhos azuis”.
Em tempo real, comunicamos ao cliente em Brasília, do sucesso de
nossa investigação privada, e sugerimos que marcássemos uma reunião para as
providenciais junto a Polícia, e determos os funcionários envolvidos.
Esclareço que, como não somos policiais, não temos a obrigação
ou dever de levar as autoridades, a suspeita do crime praticado, nosso
compromisso encerra-se com o dever de relatar a verdade dos fatos ao nosso
cliente.
O Sr. João, por ser de Brasília, disse que primeiro precisava
desenrolar seus problemas administrativos com relação a filial e aos
funcionários envolvidos, contudo após recuperar a carga e restabelecer a devida
entrega para o Órgão Público optou por não mais nos procurar e resolver seu
problema internamente.
Possuímos muita ética e respeito em nossa relação com os nossos
clientes e sempre respeitamos os seus motivos e suas decisões e assim demos por
finalizada a Operação.
Com a certeza do dever cumprido, mesmo com atraso da entrega,
sabemos que muitas pessoas foram beneficiadas com o nosso trabalho, assim
prosseguimos na Baker Street à espera do próximo caso!
FIM.
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